terça-feira, 16 de novembro de 2010

O Biorrisco das tecnologias Traitor e Terminator


Desde 1994 os transgênicos apareceram à venda nas prateleiras de supermercado dos EUA. Introduzidos em nossa alimentação sem consulta prévia, ou estudos que verifiquem seus potenciais riscos a médio e longo prazos, convivemos com tecnologias cada vez mais avançadas e que hoje não se restringem a substâncias químicas e artefatos mecânicos. A tecnologia de hoje utiliza seres vivos como matéria prima e instrumento. A questão é: em prol de quem eles estão sendo criados?

Traitor e Terminator são definições para tecnologias empregadas na manipulação genética de organismos vivos. Ambas palavras parecem ter saído de uma história de terror, lembramos que a transferência de genes entre espécies distintas é alusiva à história de Mary Shelley, onde no final a zelada criatura destrói seu criador. Não considerando a tentativa de construção moral, empregada pela autora de ’Frankeinstein’ como barreira ao desenvolvimento tecnológico, devemos constar que o uso da transgenia na medicina e em cultivares comerciais ou experimentais pelo mundo tem sido regulado por instrumentos legais como o Protocolo de Cartagena, do qual o Brasil é um dos seus 131 signatários. Alguns países como a Argentina, Chile, Uruguai, Canadá, Estados Unidos, Austrália e Rússia ainda não assinaram o protocolo.

O Protocolo de Cartagena é o primeiro e único acordo internacional existente na Convenção sobre Diversidade Biológica (CDB), sendo adotado em 2000, para entrar em vigor apenas em 2002. Desde então ele rege a transferência, o manejo, o uso e a comercialização de Organismos Geneticamente Modificados (OGM/transgênicos). Essas são questões importantes no âmbito nacional e internacional, e serão discutidas na 3 a Reunião das Partes do Protocolo de Cartagena (MOP-3) em Curitiba, a partir do dia 13 de março.

A conhecida polêmica entre entidades civis, movimentos ambientalistas versus as empresas de biotecnologia gira em torno dos conflitos criados por interesses desiguais como as leis de comércio e o regime de Biossegurança internacional. Conciliar tais interesses seguindo-se o Princípio da Precaução proposto formalmente na Conferência Rio-92 e reiterado constantemente pelas organizações ambientalistas, demonstra-se impossível, pois até hoje, não é reconhecido como norma jurídica, apenas um princípio não universalmente aplicado.

A utilização do Princípio da Precaução fere interesses comerciais englobando áreas como saúde, meio ambiente, agricultura, comunicação e do direito, pois parte do pressuposto da Incerteza científica quanto à implementação e uso de novas tecnologias. O desafio em torno da biossegurança é justamente o reconhecimento da ocorrência de danos oriundos do emprego de novas tecnologias e para isso faz-se necessário uma criteriosa avaliação de risco.

Para a Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio) que desde março de 2005, através da Lei de Biossegurança (Lei 11.105), regula o uso de OGMs no país, tem como diretrizes o estímulo ao avanço científico na área de biossegurança e biotecnologia, a proteção à vida e à saúde humana, animal e vegetal e a observância do Princípio da Precaução para a proteção do meio ambiente (Artigo 1o). Mas segundo o atual presidente da Comissão, Walter Colli, o Princípio da Precaução ainda deverá entrar num consenso e a partir dele a Comissão continuará seu trabalho (O Estado de SP, 17/2/2006).

O T de transgênico deveria estar nas embalagens com produtos que contêm soja transgênica. Você já viu algum estampado?

Em períodos de COP8/MOP3 a discussão aumenta e ambientalistas declaram preocupação com relação à posição do Brasil, no que diz respeito a transgenia. Por ser o segundo maior produtor de soja no mundo, na sua maioria convencional, os "olhos" de países produtores de transgênicos como Canadá, Estados Unidos e Argentina; e de empresas transnacionais que fabricam sementes modificadas, como a Monsanto e Delta & Pine, voltam-se para o Brasil. O país é considerado estratégico na difusão global dos transgênicos, tais multinacionais são as grandes propagadoras de seus "benefícios" e uma posição positiva do Brasil, com relação aos transgênicos, pode ajudá-las na implementação de seus produtos.

Desde 1996 a Monsanto está em destaque na briga pela liberalização dos transgênicos. De forma ilegal, permitindo o contrabando de suas sementes através da Argentina, a empresa teve sua soja introduzida em plantações no Rio Grande do Sul. O material modificado disseminou-se contaminando 80% da área semeada no estado. Naquela época os produtores levantavam a hipótese de que a soja modificada também tivesse se espalhado para outros estados. A propagação da soja contrabandeada caracterizava-se como fato consumado, o que permitiu em 2004 ao Governo Federal, liberar para comercialização a soja ilegal.

Essa situação fez as entidades ambientalistas afirmarem que liberar a comercialização da soja transgênica, desencadearia uma série de outras medidas favoráveis às empresas de biotecnologia. Desta maneira a Monsanto conseguiu que suas pesquisas em biotecnologia, e comercialização da sua soja, milho e algodão, fossem autorizadas. A CTNBio, responsável pela regulação das pesquisas e do comércio de transgênicos no país, concedeu autorização para a Monsanto em nota pública.

Exterminadoras do Futuro

As palavras Traitor e Terminator de origem inglesa referem-se a traços (de traits para expressão genética) e exterminador (de Terminator). Quando nos referimos às sementes Terminator logo vem à cabeça o filme de ficção estrelado por Arnold Schwarzenegger. Dividido em 3 partes a saga narra a estória de uma família tentando impedir que o futuro seja devastado pelas máquinas. O "Exterminador do Futuro" vivido por Schwarzenegger volta ao passado para proteger o futuro sobrevivente e líder da resistência, John Connor, que tenta no presente salvar o mundo que um dia será dominado por máquinas altamente desenvolvidas pelo computador Skynet.

Não é à toa que o termo tenha sido colocado na semente produzida por nossos vizinhos da América do Norte. Em 1998 a multinacional Delta & Pine obteve do Departamento de Agricultura dos EUA (USDA) o direito de patente sobre o Controle de Expressão Genética Vegetal das sementes que se comportam como suicidas, ao terem determinados traços de expressão genética ativados. A empresa do ramo de sementes, transgênicos e agrotóxicos é uma das mais expressivas na área de sementes geneticamente modificadas e híbridas.

O termo correto para tais tecnologias é Tecnologia de Restrição no Uso Genético, em inglês, Genectic Use Restriction Technology (GURT’s). As tecnologias GURT’s dependem da ativação ou desativação de genes através de indutores químicos ou pela multiplicação de organismos estéreis já com seus genes de esterilização ativados. Dentro das GURT’s existem duas tecnologias distintas: a T-GURT e a V-GURT.

Traitor / T-GURT

Do inglês trait variety genetic use restriction technologies onde o T refere-se a traits (traços) e consiste na transferência de genes que conferem determinadas características (traços) à semente e suas respectivas plantas. Tais particularidades podem ser de esterilização ou não, e ocorrem mediante a aplicação de determinado produto químico. As características podem conferir o crescimento, o nascimento de frutos etc. Tal tecnologia também é conhecida como switch technologies, ao pé da letra, tecnologias de interruptor, nas quais as plantas são ligadas por interruptores químicos.

Terminator / V-GURT

Do inglês variety genetic use restriction technologies onde o V refere-se a variety (variedade) e consiste na transferência de genes que tornam totalmente estéreis as sementes da 2.ª geração, e por isso são denominadas sementes suicidas e /ou estéreis. A tecnologia V-GURT, vulgo Terminator, representa o último grau no processo de esterilização das gerações iniciado pela hibridação, onde por meio do melhoramento genético – diferente de transgenia – as gerações de sementes posteriores não atingem o mesmo grau de excelência da primeira geração, tendo algumas comportamento inclusive estéril.

A tecnologia Terminator confere às empresas que obtiverem o uso de sua patente um benefício econômico inigualável, pois a partir dessas sementes é criado um mecanismo de exclusão tecnológica: O agricultor seria obrigado a comprar sementes a cada safra, o replantio seria abolido e não por vias contratuais como é atualmente, mas pela impossibilidade genética de replantio.

Devido a essa questão que fere o direito dos agricultores em perpetuar suas plantações sem a intromissão de empresas multinacionais e também pelo fato de que a tecnologia Terminator não tem comprovação segura quanto aos seus riscos de disseminação, contaminação e na saúde, é criada uma moratória em 2000 com relação a sua venda, uso, patenteamento, licenciamento e registro como OGM.

Entendendo o perigo que a tecnologia representa, foi a CDB de 2000 quem primeiro requeriu aos governos de todo o mundo a não comercialização e o não plantio - inclusive experimental - dessas sementes.

Segundo o economista David Hathaway as tecnologias Traitor e Terminator foram criadas para fortalecer a proteção sobre o direito de propriedade das empresas que as fabricam, assegurado que os agricultores que as utilizem não as replantem, nem a concorrência as copiem. As tecnologias Traitor também conferem benefícios econômicos às multinacionais ao comercializar sementes em conjunto a outros produtos fornecidos pela empresa, como o caso da soja Round-up Ready da Monsanto, resistente ao herbicida Round-up fabricado por ela, e do milho Starlink, resistente ao herbicida fabricado pela Aventis.

O bloco das Biotecnologias

Desde 1996 é possível verificar a fusão e incorporação de empresas do ramo farmacêutico, de agro-químicos, sementes e alimentos. Segundo Gabriel Fernandes um dos dirigentes da campanha "Por um Brasil Livre de Transgênicos", sozinha a Monsanto domina 88% do mercado de sementes transgênicas e em relação ao mercado de sementes mundial, 10 empresas concentram 50% do mercado. Cargill, Novartis, Du Pont, Pioneer, Quaker Oats Co., Delta & Pine, conhecidas mundialmente como empresas do ramo de cereais e agroquímicos agora colocam suas fichas no monopólio de sementes.

Já empresas como Bayer, Basf, Ciba-Geygi, Syngenta-Novartis, Pfizer, Pharmacia, permanecem enfocadas nas tecnologias de laboratório e suas possíveis patentes para uso medicinal. Segundo o jornal Inglês The independent os recursos biológicos do continente africano têm sido explorados por uma dezena de multinacionais do Oeste, sem que os benefícios conquistados a partir de seus derivados sejam repassados aos países ou comunidades de origem. Para Beth Burroows do instituto Norte Americano Edmonds, um dos responsáveis pelo relatório que demonstra a ação dessas empresas no continente, "é uma nova forma de pilhagem colonial, o problema é que vivemos num mundo em que as empresas apropriam-se do que querem e onde querem e depois nos passam a idéia de que assim fazem para o bem da humanidade".

Para o Movimento dos Trabalhadores sem Terra (MST), entidades ambientalistas como o Greenpeace e entidades de defesa do consumidor como o Instituto de Defesa do Consumidor -IDEC, a fusão de empresas de setores tão diversos e tão primordiais, como alimentos, sementes e medicamentos, representa um perigo para a sociedade, que em breve não terá controle algum sobre a forma como são produzidos alimentos e remédios; como serão distribuídos, comercializados ou se são benéficos ou não à sociedade. Para o MST, o Brasil já sofre este risco, pois apenas 10 transnacionais têm o controle monopólico das principais atividades agrícolas do país, são elas: Bunge, Cargill, Monsanto, Nestlé, Danone, Basf, ADM, Bayer, Sygenta e Norvartis.

Recentemente a empresa Monsanto alegou não ter interesse em usar a biotecnologia Terminator, mas nada se referiu à tecnologia T-GURT da soja Roundup Ready, produzida pela transnacional que é do grupo americano Elly Lilly, maior produtora de defensivos e drogas farmacêuticas, do planeta. Mesmo vivenciando uma briga por patentes e Royalties na Argentina, Brasil, EUA e Canadá, a empresa de biotecnologia continua a passar a idéia de que seu trabalho é apenas em benefício da humanidade.

O perigo das sementes suicidas Terminator e suas irmãs Traitor é sua contaminação no meio ambiente, por se tratarem de organismos vivos passivos da reprodução, a humanidade não teria tamanho controle. A disseminação das sementes transgênicas é uma ameaça diferente da vivida pelo personagem de ficção John Connor, mas não tão diferente se vista pela perspectiva do computador Skynet, que fora de controle estava destruindo a humanidade.

Infelizmente não teremos um herói como Schwarzenegger voltando ao passado para salvar o que restaria da humanidade sendo dominada pela biotecnologia, hoje, praticamente monopolizada por empresas que se dizem humanitárias, mas que ao fim de todo o balanço, entregam sua alma às contas de seus acionistas.

Corporações mais envolvidas com as tecnologias GURT’s:

Monsanto (http://archive.corporatewatch.org/genetics/commercialisation/monsanto.htm)

Bayer (http://archive.corporatewatch.org/genetics/commercialisation/bayer.htm)

Novartis Syngenta (http://archive.corporatewatch.org/genetics/commercialisation/syngenta.htm)

Du Pont (http://archive.corporatewatch.org/profiles/dupont/dupont.htm) Advanta (http://archive.corporatewatch.org/profiles/biotech/advanta/advanta1.html)

Aventis (http://archive.corporatewatch.org/publications/GEBriefings/aventis1.html)

Disponível em: http://www.terrazul.m2014.net/spip.php?article313

2 comentários:

  1. É isso aí, é preciso colaborar com a formação do censo crítico dos amigos que gostam de ormar opinião acerca das armadilhas o capitalismo selvagem.

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  2. É o nosso compromisso como movimento estudantil organizado. Todos unidos em uma idéia só: Proteger a natureza e a população mais desfavorecida!

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